CCEE quer nova governança e aumenta custos
Maurício Corrêa, de Brasília —
Um ano depois, embora tenha sido recebida com enorme desconfiança pelos agentes na primeira tentativa, a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) volta à carga e recoloca na mesa a proposta que altera a sua governança.
Num primeiro momento, agentes ouvidos de forma reservada por este site criticaram pesadamente a proposta. Afinal, o texto da própria nota técnica reeditada pela CCEE admite que haverá aumento de custos para o conjunto dos agentes. São custos que no final serão bancados pelos consumidores.
Também existe uma desconfiança em relação ao papel do MME no encaminhamento da questão. Foi lembrado ao site “Paranoá Energia” que o MME sempre interferiu nas eleições para o Conselho de Administração, utilizando nas assembleias o peso dos seus votos.
Teme-se agora que o MME use o seu poder invisível, nos bastidores — o mesmo poder que elege conselheiros da CCEE, para produzir uma governança que seja na medida dos interesses do Governo. Nas gestões petistas anteriores, o Governo hostilizou o mercado de tudo quanto é forma e os agentes nunca esqueceram esse pequeno detalhe.
Esse receio nem considera a figura do ministro Alexandre Silveira, que é visto como um político pró-mercado, mas que faz parte de uma estrutura de coalizão onde existem vários dirigentes que odeiam qualquer coisa que diga respeito aos mercados em geral e podem aproveitar o momento para asfixiar o empresariado com mais força.
O que os agentes temem são os petistas de carteirinha, que têm prestígio na área de infraestrutura e vivem no entorno do presidente da República, onde, dia sim, dia não, querem inclusive desestabilizar o próprio ministro. Silveira administra esse povo com enorme paciência.
A CCEE enviou a proposta de nova governança ao Fórum das Associações do Setor Elétrico (Fase), na semana passada, considerando como motivação para a mudança a ampliação do mercado de energia elétrica a partir de 2024.
Para a CCEE, será impossível enfrentar uma nova realidade do mercado com as limitações impostas pela estrutura organizacional atual.
Embora a Câmara seja considerada um órgão neutro, indiretamente vinculado ao Ministério de Minas e Energia (que indica o presidente do Conselho de Administração), a proposta aproxima a CCEE de uma espécie de estatal. Os agentes terão três semanas para formatar as suas contribuições.
“Neste momento, sobretudo em um contexto de abertura do mercado e da necessidade de adoção de medidas que elevem a segurança do mercado de comercialização de energia elétrica, a CCEE está diante da oportunidade de aprimorar a sua Governança Corporativa, inclusive a Governança do Monitoramento do mercado, com base nas melhores práticas observadas e buscando equilíbrio com as particularidades do segmento de energia elétrica, visando fortalecer sua transparência, responsabilidade corporativa e setorial, equidade e prestação de contas”, argumentou a nota técnica de 20 páginas, homologada por todos os integrantes do atual Conselho de Administração da CCEE.
Pelo que foi possível observar em conversas com alguns agentes, que começaram a refletir sobre a questão no último fim de semana, as mudanças não serão tão fáceis assim, até porque a própria nota técnica admite que haverá custos adicionais de R$ 7,2 milhões por ano na implementação da nova governança.
Uma fonte deste site não deixou por menos: “Se eles admitem que o custo da CCEE poderá crescer R$ 7,2 milhões anualmente, na realidade ficará bem mais do que isso”, comentou.
De fato, a CCEE estima um incremento de R$ 7,2 milhões ao ano para custeio da nova estrutura organizacional proposta na nota técnica, o qual ainda pode variar em razão das atividades que serão definidas com o fechamento da CP 11/2022 que trata do monitoramento prudencial dos agentes que operam no mercado.
“Este acréscimo equivale a 3,6% do orçamento para o ano de 2023, ou seja, um custo mínimo frente ao benefício esperado”, admite a Câmara. Uma fonte consultada pelo “Paranoá Energia” ironizou e definiu assim esse comentário feito pela CCEE: “Muita ingenuidade desse pessoal. Não é assim que o mundo funciona. Parece argumento de uma adolescente de vestido cor de rosa, pronta para assistir o filme da Barbie”.
Na visão dessa fonte, a própria história da CCEE prova que não se pode acreditar nessa “história feita para boi dormir”, lembrando que originalmente a CCEE, quando se chamava MAE, foi constituída apenas para cuidar dos contratos de energia elétrica. E hoje “parece uma árvore de Natal, de tantas atribuições adicionais que foram dadas à CCEE. É muito penduricalho e fazer a gestão disso tem custo alto”.
Além disso, a nota técnica registra com clareza que o custeio da Câmara precisa ser aperfeiçoado de modo a alocar de forma mais adequada os custos mínimos para operação de cada agente na CCEE, através de uma cobrança associativa fixa, denominada de “Contribuição Associativa Mínima”.
Tem mais facada. Os custos para os agentes não param por aí, pois a NT propõe uma cobrança adicional proporcional à energia transacionada, denominada de “Contribuição Associativa Operacional”.
Neste cenário, os atuais emolumentos, que são odiados por 10 entre 10 agentes vinculados à CCEE, continuarão sendo cobrados sempre que houver atividade ou serviço específico.
A CCEE quer, num primeiro momento, evitar discussões intermináveis no Congresso, que poderiam atrasar a mudança, razão pela qual propõe que as alterações ocorram apenas no âmbito infralegal, incluídas as adequações normativas, como decretos e resoluções da Aneel.
Mas, num segundo momento, quando as mudanças já estiverem em vigor, a CCEE sugere que sejam feitas mudanças na legislação em vigor, permitindo que dirigentes de empresas que operam no mercado e servidores da própria Câmara sejam penalizados nos seus CPF´s de pessoas físicas por eventuais lambanças praticadas no mercado.
“A CCEE entende, inclusive, ser recomendável a alteração da legislação para que as pessoas fsicas (CPF’s) dos gestores dos agentes e dos gestores desta diretoria (de Monitoramento do Mercado) respondam civil, criminal e administratvamente por atos dolosos ou com culpa grave que possam pôr em risco a segurança das operações do mercado e/ou o sigilo das informações”, destaca a nota técnica.
Foi proposta a existência de um Conselho de Administração, mas destituído das atuais funções executivas, as quais seriam transferidas a uma Diretoria-Executiva.
Segundo a CCEE, a proposta considerou as “melhores práticas” existentes na praça, tais como as defendidas pelo Insttuto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), Banco Central do Brasil, Balcão Brasileiro de Comercialização de Energia – BBCE, Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais – Anbima e Câmara Interbancária de Pagamentos – CIP, entre outras.
Para a Câmara é fundamental que a nova governança se baseie não só em aspectos modernos relacionados à estrutura de governança, mas, também, aos processos de monitoramento de mercado.
A governança proposta vai segregar as atribuições estratégicas e operacionais. A atual Superintendência será substituída pela Diretoria-Executiva. Caberá ao novo CA tocar o direcionamento estratégico, com atribuições de planejamento e supervisão.
A proposta prevê a criação do Comitê Consultivo de Segurança de Mercado (e do Comitê de Implementação durante o período de transição para a operação definitiva) e a designação de uma nova Diretoria com atribuição exclusiva para o monitoramento do mercado (“Diretoria de Segurança e Monitoramento de Mercado”).
O novo Conselho de Administração (CA) deverá ser composto por sete membros titulares (e seus respectivos suplentes), sem dedicação exclusiva, sendo um representante do MME, no cargo de presidente; um para cada categoria de geração, comercialização, categoria de consumo, distribuição e dois conselheiros independentes (que devem ser selecionados pelos demais membros do CA).
Após a sistematização dos comentários que serão oferecidos pelos agentes do mercado, a CCEE iniciará imediatamente uma discussão com a Aneel e o MME. Em seguida, fechado o texto da proposta, será convocada uma assembleia para aprovação da nova governança.