AP na Câmara debate venda direta de etanol
Da Redação, de Brasília (Com apoio da Plural) —
Uma audiência pública programada para a Câmara dos deputados debaterá, nesta quarta-feira, dia 11 de julho, a partir das 10 horas, a questão dos mecanismos de comercialização direta de etanol hidratado no País. A Plural está associada à Única, Fecombustíveis, Brasilcom e Sincopetro na defesa da proibição da venda direta de etanol, iniciativa que é apoiada por usinas localizadas no Nordeste do País.
Para os dirigentes da Plural, Única, Fecombustíveis, Brasil e Sincopetro, entre os problemas que o País poderá enfrentar a partir da venda direta estão o o aumento da sonegação e perda de arrecadação para os Estados; mais custos para os consumidores; riscos de desabastecimento; crescimento no volume das fraudes de produtos, já que a ANP terá mais dificuldade para fiscalizar usinas descentralizadas. Além disso, acreditam que se liberada a venda direta haverá riscos para o fracasso do RenovaBio, um programa que recentemente recuperou as possibilidades de fortalecimento do setor.
O racha entre os usineiros ficou bastante claro e dividiu o Brasil em dois nesse segmento. O argumento da venda direta surgiu durante a longa greve dos caminhoneiros e seus defensores alegam que possibilitará o barateamento do produto, considerando que haverá a diminuição do preço na cadeia, evitando o passeio do etanol e permitindo a contratação direta entre os produtores e os consumidores.
Para as cinco entidades que se posicionaram contra a venda direta os argumentos se explicam da seguinte forma:
- Toda a cadeia e o mercado legal são contra. A Única, entidade que representa os produtores, a Plural e a Brasilcom, que representam as distribuidoras, e a Fecombustíveis e o Sincopetro, que representam os revendedores.
- O modelo atual ainda é respaldado pela ANP, que optou por dividir as responsabilidades entre produção, distribuição e revenda, justamente para garantir uma estrutura sólida e que permita o abastecimento de maneira segura e consistente em todas as regiões do país, propiciando ao consumidor a chegada do produto a custos competitivos e permitindo aos produtores, distribuidores e varejistas/consumidores vantagens com a economia de escala que permitam negociações em grandes volumes e a otimização de fretes.
- A estrutura vigente chancelada pela ANP permite um relacionamento comercial sólido entre distribuição e revenda que facilitaria a concessão de crédito aos agentes que operam no varejo e capilaridade que garante a presença do etanol em todos os Estados do país, por meio de bases de armazenagem em todas regiões geográficas. Este é um modelo que existe em todos os mercados do mundo e tem ampla competição em todos os elos da cadeia e, portanto, o consumidor é o real beneficiado. O novo modelo proposto derruba esta solidez.
- A usina não pode vender diretamente porque um posto de combustíveis não vende só etanol hidratado. Ele recebe em um único caminhão diesel, gasolina e etanol. Além disso a gasolina no Brasil tem 27% de etanol anidro que precisa sair da usina e ir para a base da distribuidora para ser misturada à gasolina que é recebida da refinaria. Portanto o etanol hidratado já se beneficia do transporte conjunto com o etanol anidro. A proposta que corre na Câmara e Senado não leva em conta as complexidades que envolvem o setor.
Na percepção das cinco entidades, os desafios são inúmeros para dar vazão ao combustível e garantir a entrega aos mais de 40 mil postos de revenda em um território gigantesco como o brasileiro. Os produtores teriam de encontrar capacidade de substituir sistemas de dutos, ferrovias e bitrens garantidos pelas distribuidoras para colocar o combustível na rota da usina ao posto. Sem essa estrutura, vai aumentar o tempo total de viagem no processo de entrega direta em razão da fragmentação dos volumes pelos postos de revenda, o que pode ser um problema sério para as localidades mais distantes das regiões produtoras, que estão concentradas essencialmente no interior de São Paulo, Centro-Oeste e Nordeste.
“A saída das distribuidoras deste processo de venda do etanol também causará perda de escala na contratação de frete, além do aumento de custos administrativo e operacional para atividades de carregamento/armazenagem, faturamento, crédito, cadastro, programação e atendimento. Uma série de ações que não custariam menos de R$ 870 milhões ao ano”, alegam.
Esse valor foi indicado por um estudo da consultoria Leggio, demonstrando que o modelo proposto pelo usineiros do Nordeste aumentaria o custo de transporte em 24,7% da realidade atual, o que representa R$ 181 milhões adicionais por ano. Além disso, o aumento do custo do frete, provocado pela perda de escala, representaria R$ 34 milhões no caso do etanol anidro e mais R$ 252 milhões nos casos de diesel B e gasolina C. Dados da Plural, a associação nacional das distribuidoras de combustíveis, estima ainda outros R$ 410 milhões de custos administrativos e operacionais das usinas. “Uma conta que sobrará para o consumidor”, apontaram as entidades.
“Importante lembrar que 58% dos postos operam com marcas. Ou seja: a partir da venda direta, estes postos não poderiam comprar de uma usina, pois estariam enganando o consumidor e descumprindo regras contratuais. O prejuízo ao consumidor também pode ocorrer pela fragilização dos processos de controle de qualidade dos combustíveis fornecidos aos postos revendedores. O modelo vigente viabiliza mecanismos de fiscalização dos agentes regulados e sua respectiva responsabilização pelas atividades efetuadas”, assinala um comunicado distribuído pela Plural, mas de comum acordo com as outras quatro entidades que são contra a venda direta.
Só em 2017, a estimativa da ANP é que R$ 5,9 bilhões foram arrecadados em ICMS de venda de etanol em todo país. Considerando que a contribuição das distribuidoras é massiva na comparação com a parte do produtor, abre-se a discussão para descobrir quem pagaria essa conta. Sem o distribuidor na cadeia, um buraco tributário se abre e aumenta o número de pontos de arrecadação de cerca de 200 para mais de 40 mil
Pelas regras em vigor, o produtor/importador e o distribuidor são responsáveis pelo recolhimento do PIS/Cofins incidente sobre a receita bruta auferida na venda do etanol hidratado, na proporção de R$ 0,13 por litro e R$ 0,11 por litro, respectivamente. A ausência do distribuidor exigirá mudanças na legislação que regula a cobrança deste tributo federal, tendo como alternativas 1) concentrar a arrecadação no produtor ou 2) repassar essa atribuição diretamente aos revendedores (mais de 40 mil postos). “O controle disso seria muito difícil. Portanto os R$ 0,11 por litro estão sob risco”, argumentam as entidades.
Para os dirigentes do setor sucroalcooleiro do Nordeste, o consumidor não é beneficiado pelo sistema atual, devido à intermediação dos distribuidores de combustíveis. Eles entendem que existe uma anomalia entre os distribuidores e os postos de combustíveis, razão pela qual não existiria motivo para que seja proibida a venda direta aos postos. Nesse contexto, a venda direta resultaria em mais transparência no processo, com redução de preços. Também alegam que em vários países a comercialização é feita desse jeito.
Na Câmara, as bancadas estaduais estão posicionadas de forma a proteger os interesses das usinas de seus respectivos estados. Enquanto os congressistas de Alagoas e Pernambuco, por exemplo, estão fechados com a proposta da venda direta, a proibição é abertamente defendida pelos parlamentares de São Paulo, Minas Gerais ou Goiás.